quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Este post vai ser longo

Lá para 2006, mais ou menos, eu fui demitido e fiquei desnorteado. Nunca havia ficado sem emprego antes, não sabia o que fazer. Entretanto, eu também fui demitido porque queria, já que estava bem insatisfeito com meu emprego e passei a acochambrar mais do que o meu normal - e olha que meu normal já é bem relapso. O que mais me incomodava era o constante clima de terror em todos os dias da semana, sendo que na segunda a coisa começava às 8 da manhã. Eu devia, mas eu não tinha coragem de me demitir.

Aí, foi esperar o facão. Terceirizei o trabalho.

Bom, daí estou subindo a Consolação, no meio de uma tarde de terça-feira, sem saber o que seria dali por diante e toca o telefone. É o PC, querendo saber alguma coisa, não lembro o quê. Falei a ele que havia sido demitido e ele ficou desesperado. Nem dá pra dizer que foi mais do que eu, porque eu estava atônito. Parecia lesado, dopado. Ele disse pra contar com ele, que ele me passaria trabalho, frilas, o que fosse. Ele já vinha passando esses trampos há algum tempo, porque eu ganhava muito mal na Folha nessa época.

Foi quando, pela primeira vez na vida, pensei seriamente em virar frila por uns tempos.

E assim foi, graças à ajuda do PC. O tempo passou, tentei voltar às redações, mas já estava acostumado demais com os frilas. É mais fácil quando você tem um frila fixo, que te sustenta, e pode ir levando os outros. E aí, mesmo que os eventuais sequem, tem sempre o fixo. Fica mais fácil ainda quando quem garante esse fixo é seu melhor amigo, que além de tudo conserta suas mega-cagadas, acochambradas, e outras adas tais e nem reclama por isso.

Aí, com essa facilidade, a coisa foi ficando séria. E por uma série de eventos que se encaixaram - se eu não tivesse ido para a Folha, não teria conhecido o Petró, que não me indicaria umas 3 vagas no UOL, as quais, depois de falhar 3 vezes no processo seletivo, me levaram ao Madu, então editor, que acabou me passando frilas e depois mais e mais frilas - consegui suporte o suficiente para montar a minha empresa. Com o PC, que tava de saco cheio do trabalho e queria sair.

Mas ele sempre foi mais previdente e consciente e centrado do que eu. Sairia do trabalho e passaria 100% à Entre Aspas quando fosse melhor financeiramente, logisticamente, corretamente. Sem pressa. Até lá, não acochambraria no emprego. Pelo contrário, daria o melhor de si e iria, como foi, se tornando peça essencial no sistema dessa empresa.

Bom, mas voltando, tudo para mim começou com uma demissão - antes da Folha, havia passado 5 anos odiando meu emprego anterior e sem coragem para me demitir (e aí, sim, lá nessa empresa, pela política da época, eu nunca seria mandado embora).

Corta para 2009, setembro ou outubro. Estou voltando da Entre Aspas. Nani e eu. Como ele havia batido o carro, estamos no meu. Mais uma vez, como ele havia batido o carro, o meu está cheio de coisas do Nani: guitarras, notebooks, pedaleira, HD externo. Meu mesmo, só mais um outro notebook. Assalto. Levam tudo. Um caminhão da Granero em eletrônicos, praticamente.

Nessa época, já fazia algum tempo, eu estava afastado de algumas coisas que me faziam falta, mas eu nem lembrava. A minha família, via muito pouco. Havia parado de ir ao centro há anos. Trabalho voluntário era uma mera lembrança de quando eu tinha 20 e poucos.

Aí, as coisas começaram a se desenrolar.

Ao saber que eu tinha sido assaltado, meu tio passou em casa e me levou ao Centro. Fiz um cartão de tratamento. Nos mudamos, porque não tínhamos mais segurança na Casa Laranja. Eu voltei à casa dos meus pais. No Poupatempo, para fazer novos documentos, conheci o Escreve Cartas e voluntariei-me. Já percebendo que tinha ainda mais tempo, me inscrevi também no CVV. Tentei meditação, piano. Emagreci mais de 10 quilos sem remédio. Montei uns 10 blogs, mas entrei nesse com o Paulo, outro amigo querido que também está procurando seu caminho e que volto a conviver depois de muito tempo.

E eu devo terminar esse 2010 como o ano mais engrandecedor da minha vida. Pelo que me lembro, e pelo que escrevi aqui, isso tudo começou com um assalto.

Tudo isso para dizer que mudanças são boas. Eu e o Paulo estamos vivenciando isso. E o outro Paulo, não o que escreve aqui comigo, mas o PC, pode enxergar isso em algum tempo. Curtíssimo, eu acho.

Em 2006, ainda atônito, a Helena me disse uma frase que gostei. "Mudanças são boas." Ela, como em tantas outras coisas, tinha razão - e ela acaba de operar uma mudança homérica na vida dela. Essa frase se encaixa perfeitamente em outra, que o Porcão me disse uma vez, que é óbvia, mas nunca lembramos "nada é definitivo". As pessoas têm mania de pensar o contrário. Hoje é possível mudar de emprego, de casa, de cidade, de estado civil. E se der errado, desfaz-se. Se não é possível desfazer, muda-se. Apela-se. Inventa-se. Reinventa-se. Quase sempre há opções. E se não as há, pode-se avacalhar.

Então, quando há uma mudança brusca na vida de alguém, em especial quando alguém perde um emprego (ou termina um namoro), eu costumo dar os parabéns (se for o namoro, vai mentalmente a congratulação, porque honestidade demais é falta de educação). Normalmente, o que se vê por aí são lamentações.

Claro, há outras questões envolvidas - e quando a decisão é unilateral e você é o lado que somente recebe a notícia, sua auto-estima vai pro saco - mas de forma geral tendo a enxergar com bons olhos. O sentimento inicial tende a passar - como diz o Caio Fernando Abreu, em Vai Passar - e quando passa, o que fica são centenas e centenas de possibilidades e de caminhos e de experiências.

Que podem ser boas ou não. Depende do quanto você está pronto para fazer a escolha mais acertada, depende do seu discernimento, da sua disponibilidade e da sua sensibilidade para enxergar os sinais, de senti-los. Depende ainda do quanto você está pronto para arregaçar as mangas e trabalhar para buscar seu caminho - ou mesmo abri-lo, com uma chave, à força ou assoprando. "Quando o trabalhador está pronto, o trabalho aparece."

Por fim, se é que alguém chegou até aqui neste post, vou falar dos meus planos para 2011: ser, nos próximos tempos, para o PC o que ele foi e tem sido pra mim desde 2006, ou o que ele tem sido para tanta gente desde o início da agência. E se, de alguma forma, com isso ele puder encontrar seu próprio caminho (coisa que acredito piamente), ou abri-lo com um sopro ou à força, não importa, a Entre Aspas já cumpriu seu papel na Terra.

Bem-vindo e parabéns, PC.


segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

As Coisas se Resolvem Sozinhas

32 anos sem dar uma olhadinha mais atenta para dentro é um tempo e tanto. Daí, quando se começa, encontram-se muitas coisas curiosas. Percebi esses dias que os defeitos alheios que mais me irritam são exatamente os que tenho. Embora esteja tentando mudar, e acho que o primeiro passo para isso é se conhecer e os reconhecer, sei que sou teimoso e muito turrão.

Pois é, aí quando vejo alguém teimando ou turrando, me irrito internamente (quando me irrito, claro. Porque não é sempre) mais do que se eu vir alguém de mau humor ou sendo avarento - cito essas características em especial porque sei, com certeza absoluta, que não as tenho. Daí eu concluo que se eu não fosse eu e me conhecesse, não seria meu amigo. Frase estranha.

Mas eu comecei esse texto para falar sobre ansiedade. Sou relativamente ansioso e nunca fui de levar as coisas tão a sério - por isso, minha ansiedade sempre foi bem controlada. Mas sempre tive a tendência a sofrer por antecipação. Se eu tinha de fazer algo chato no dia seguinte, já ia dormir pensando. Se a tarde teria uma reunião chata, acordava macambuzio (palavra estranha).

Aos poucos, tento mudar isso. Meu pai sempre disse que quem sofre por antecipação sofre duas vezes. Quando, na verdade, pode não sofrer nenhuma. Às vezes, o que pode ser um chato evento vindouro pode ser, na prática, uma excelente e grata e surpreendente experiência. Expectativa é quase tudo. Aliado a isso, tenho adotado bastante o mantra do Alex, que pode parecer simplista e cômodo (e é mesmo), mas que ajuda muito a sofrer menos.

"As coisas se resolvem sozinhas." Claro, não é tudo que se resolve sozinho. E não acho que devemos simplesmente sair por aí cagando e andando para o que der e vier Mas não é uma bobagem. Na prática, a gente não tem que resolver tudo. Acho que a frase quer dizer que é possível peneirar o que fazer e quando fazer, saber delegar e não ser tão possessivo. Respeitar seus próprios limites e ainda as necessidades alheias

Tarefas extremamente difíceis.

Acho que isso tem a ver com mais duas frases que estão martelando na minha cabeça há dias - "quando o trabalhador está pronto, o trabalho aparece" e "intenção é tudo, o ato é nada" - mas ainda não achei o link. Quando achar, volto aqui para escrever mais sobre o assunto.

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Sapatos Velhos

Passar o dia usando sapatos apertados é algo muito incômodo, ainda mais quando o mercado oferece outros bem mais bonitos e confortáveis. Mesmo assim nunca fui de ter vários pares de sapatos, sempre achei que um era suficiente, mesmo que não fosse assim tão confortável, um era suficiente. Afinal de contas como poderia ter outro, isso além de inadmissível não é la muito comum, em geral só se permitem um par por pessoa, mais que isso pode ser considerado promiscuidade por muitos e em algumas culturas pode até ser punido com a morte! E então, durante anos fui fiel ao meu único par de sapatos... Ah, como eu adorava aqueles sapatos velhos e olha que nem eram assim tão confortáveis. Eles estavam em farrapos, a sola estava cheia de buracos, caminhar em dias chuvosos era impossível, portanto não havia mais o que fazer, era hora de trocá-los. Durante muito tempo a idéia de usar outro par de sapatos me causava asco, não podia em hipótese alguma pensar em traí-los, isto estava fora de cogitação. Independente do que acontecesse estaria com eles até o fim. Porém nos últimos dias meus pés estavam extremamente inchados, os calcanhares apresentavam pequenas lesões que tornavam os passos difíceis e dolorosos, as unhas doíam e ao final do dia uma fadiga inigualável tomava conta de mim, e tudo isso tornava o dia seguinte um tremendo martírio. È quase impossível seguir qualquer caminho com dores nos pés.

Decidi que era hora de trocá-los. Mas como? Durante anos nossas vidas eram uma só, nunca se via um sem o outro, éramos uma dupla, ou melhor, um trio, formávamos um ser só. Mas meus sapatos além de velhos não me serviam mais, meus pés haviam crescido, eu havia mudado ee acho que não perceberam o quão diferente estava, ou talvez não entendessem... E isso tudo impedia de continuarmos servindo um ao outro.


Foi aí que fui a uma loja e comprei outro par de sapatos. Comecei a semana usando-os. Estranho, mas estou me sentindo bem. Quase não penso nos velhos. Parece que o conforto que este proporciona me fez quase que completamente esquecer-me de meus velhos amigos. Foi difícil acostumar-me com a idéia dos novos sapatos, mas tem sido agradável usá-los, mesmo que em alguns momentos me pegue pensando nos velhos. Talvez sempre pense, ou talvez não, não sei. O fato é que não havia outro jeito: eu precisava de sapatos novos, mas para enxergar e aceitar meus pés precisaram sentir muitas dores.